
Com o atual “frenesi da IA”, muitas organizações se lançam a automatizar tarefas isoladas em busca de soluções rápidas para desafios operacionais, utilizando a IA Generativa ou os incipientes — e erroneamente denominados — Agentes de IA.
Seja por meio de scripts, RPA ou inteligência artificial, o objetivo é quase sempre o mesmo: reduzir custos, acelerar processos ou minimizar erros humanos.
No entanto, essa visão fragmentada — focada exclusivamente em tarefas individuais — ignora um princípio fundamental da Gestão por Processos (BPM): a chave não está em automatizar mais, e sim em automatizar melhor. E isso só é possível quando o processo é orquestrado de ponta a ponta, idealmente com o suporte de uma plataforma BPMS (Business Process Management Suite).
A armadilha de automatizar tarefas sem contexto
Automatizar sem uma compreensão profunda e sem o redesenho do processo é tão ineficaz quanto tentar colocar um motor de Fórmula 1 em uma bicicleta: obtém-se uma potência descontrolada em uma estrutura totalmente inadequada.
A automação de tarefas sem uma visão sistêmica pode gerar gargalos inesperados, inconsistências operacionais, uma preocupante falta de rastreabilidade e, em última instância, decisões desalinhadas com a estratégia global da empresa.
Muitas organizações caíram nessa armadilha, multiplicando a implantação de robôs ou algoritmos que operam sobre processos intrinsecamente falhos, sem um redesenho prévio nem uma governança clara.
O resultado? Uma nova camada de complexidade extremamente difícil de manter, escalar ou auditar. Cria-se um labirinto tecnológico em vez de uma solução eficiente.
A Orquestração de Processos: Uma Abordagem Estratégica Indispensável
A verdadeira transformação operacional exige uma abordagem muito mais profunda: a orquestração de processos. Isso significa gerenciar de forma integral todas as tarefas, decisões, interações humanas e ações automatizadas que compõem o ciclo de vida de um processo, desde o seu início até a sua conclusão. É nesse contexto que uma plataforma BPMS torna-se uma ferramenta absolutamente essencial.
Um BPMS vai muito além de simplesmente modelar processos com BPMN 2.0. Sua principal função é orquestrar fluxos de trabalho, definir regras de negócio complexas, gerenciar eventos em tempo real, integrar de forma fluida sistemas e usuários, controlar versões para garantir a consistência, medir o desempenho em tempo real e permitir mudanças de forma ágil.
Trata-se do verdadeiro núcleo operacional capaz de alinhar, de maneira eficaz, pessoas, tecnologias e a estratégia empresarial.
Orquestrar não é apenas coordenar; é governar o processo com inteligência, total visibilidade e uma adaptabilidade essencial. Isso implica automatizar com a lógica de negócio já integrada, com dados contextuais relevantes e com decisões totalmente rastreáveis. Sem essa orquestração, a automação torna-se frágil, suscetível a falhas e, em última instância, desalinhada com os objetivos organizacionais.
Automação, Sim — Mas Sempre com Propósito
Adotar uma abordagem de automação alinhada à Gestão por Processos (BPM) implica responder a três perguntas-chave antes de qualquer implementação:
- Este processo gera valor estratégico? Nem todos os processos são candidatos ideais à automação. Devem ser automatizados apenas aqueles que impactam diretamente na experiência do cliente, na eficiência operacional, que representam uma diferenciação competitiva relevante ou que estejam diretamente ligados a um objetivo estratégico específico.
- O processo está otimizado? Automatizar um processo sem tê-lo previamente melhorado equivale a institucionalizar suas ineficiências. A melhoria contínua deve ser um pré-requisito fundamental para qualquer automação que pretenda ser sustentável e eficaz a longo prazo.
- Está alinhado com a arquitetura de processos da organização? Toda iniciativa de automação deve se encaixar de forma coerente no mapa geral de processos e no modelo operacional da organização. Não deve funcionar como um remendo isolado, mas sim como uma peça integrada.
Somente quando essas perguntas são tratadas com rigor, a automação se transforma em uma poderosa alavanca de transformação — e não em mais uma fonte de caos digital.
Sem Orquestração, Não Há Escalabilidade na Era da Automação Inteligente
Na atual era da automação inteligente (AI-driven automation), em que tecnologias como Inteligência Artificial, mineração de processos e RPA convergem, o BPMS atua como o verdadeiro cérebro e a espinha dorsal da organização:
- Cérebro, por ser a plataforma que define os fluxos dos processos, as regras de negócio, facilita decisões automatizadas e permite estabelecer caminhos alternativos de acordo com condições dinâmicas e em constante mudança.
• Espinha dorsal, por articular e integrar pessoas, sistemas, dispositivos, agentes de IA, robôs e diversas tecnologias em uma única plataforma coerente e funcional.
Além disso, um BPMS moderno permite medir, auditar, redesenhar e evoluir os processos de forma contínua. Isso é fundamental para alcançar uma verdadeira maturidade na gestão por processos e garantir a adaptabilidade da organização.
Automatizar sem um BPMS é comparável a uma orquestra com vários músicos tocando sem partitura nem maestro: o resultado é ruído, e não uma sinfonia harmoniosa. A orquestração é o que permite escalar a automação de forma eficaz, manter controle total sobre as operações, garantir a conformidade normativa e, o mais importante, melhorar significativamente a experiência do cliente.
A automação não é um fim em si mesma; é um meio. O verdadeiro objetivo é alcançar a excelência operacional — e isso só é possível com processos otimizados, governados e, essencialmente, orquestrados de ponta a ponta.
Como destaquei no Modelo de Maturidade em Gestão por Processos (BPMM), que desenvolvi em 2014, reforço que não pode haver automação inteligente sem maturidade organizacional prévia. O pilar “Tecnologias” do BPMM é apenas um dos sete. Os demais pilares — Estratégia, Processos, Pessoas, Governança, Métodos e Cultura — são igualmente essenciais e precisam estar alinhados.
Automatizar sem considerar e alinhar esses pilares é construir sobre terreno instável. Com uma gestão por processos madura e um BPMS robusto, a automação torna-se um instrumento estratégico fundamental, e não apenas uma ferramenta técnica isolada.
A automação de tarefas — com ou sem IA — pode ser útil, mas, sozinha, não é suficiente para promover a transformação. A verdadeira vantagem competitiva e a eficiência surgem quando o processo é orquestrado por completo, com um propósito claro, alinhamento estratégico bem definido e uma governança sólida.
No dinâmico mundo digital de hoje, onde agilidade, experiência do cliente (ou do cidadão) e eficiência são diferenciais decisivos, apenas as organizações que compreendem a importância de orquestrar seus processos com um BPMS estarão, de fato, preparadas para escalar, inovar e liderar seus mercados.
Autor: Pedro Robledo – Especialista em BPM